sábado, 30 de janeiro de 2010
MULHER SEM ROSTO
Eu vi uma mulher sem rosto
Me deu vontade, me deu desgosto
Não pude ver a mulher de dentro
Por fora, um manto de convento
Era uma enclausurada a caminhar!
II
Seus olhos proibidos de se ver
De certo não evitam seu querer
Devia sentir muita falta do vento
Pelo seu vulto em movimento
Era uma penitente a caminhar!
III
Parecia ventilar os seus segredos
Timidamente escorrendo pelos dedos
Quem sabe liberta dos conselhos
Sem tarefas de agulhas e novelos
Era uma subjugada a caminhar!
IV
A mulher tinha a boca amordaçada
No entanto parecia conformada
Poderia ser mulher de um harém
Ou odalisca desgarrada sem ninguém
Era uma escravizada a caminhar!
V
Eu vi a mulher abafada e contida
Debaixo daquela roupa, sua vida
Acho até que não tinha identidade
Pois não tinha cara nem vaidade
Era uma amputada a caminhar!
VI
Seu mundo limitado à sua fresta
Fora obediência pouca coisa resta
Nem imagino o mundo do seu jeito
Confesso fiquei de coração estreito
Era um espantalho a caminhar!!!
sexta-feira, 29 de janeiro de 2010
terça-feira, 26 de janeiro de 2010
domingo, 24 de janeiro de 2010
QUARTETO FORA DA LEI
Quatro amigos de infância
Combinaram se encontrar
Pra dividir os segredos
Que não dá pra segurar
Esse encontro é imperdível
Quatro figuras sem nível
Vai ser de arrepiar!
II
O encontro aconteceu
No Sítio do Zé Pinguela
Chico Bufa chegou cedo
Junto com Mané Ruela
Boca Pôde atrasado,
Ficou preso na cancela
III
Zé Pinguela foi dizendo
Que bom que vocês vieram
Contem tudo com detalhes
As maldades que fizeram
Nós vamos comendo o bode
Que roubei no cemitério
IV
Chico Bufa perguntou
Pela sua namorada
Zé Pinguela disse logo
Mora comigo a lesada
Chorava com dor de dente
Arranquei na enxadada
V
Boca Pôde não conteve
Sua bela gargalhada
Só tinha mais os caninos
Pra doer de madrugada
Zé Pinguela de marido
Coitada da desgraçada
VI
Mane Ruela falou
Silêncio que vou contar
O caso se deu comigo
Nem gosto de me lembrar
Levei chifre do cumpade
Enquanto fui viajar
VII
Chico Bufa só calado
Difícil de revelar
Certa noite lua cheia
Rio fundo foi pescar
A piranha matou fome
Logo naquele lugar
VIII
Enquanto contava casos
O quarteto mastigava
O bode foi consumido
Era osso que voava
A mulher lá na cozinha
Outro bode preparava
IX
Vai comer lá no inferno
Resmunga dona Mundiça
Pinguelinho reclamava
Perdi a hora da missa
Temos que encher o bucho
Desse monte de carniça
X
Bode regado a cachaça
Provavelmente roubada
Boca Pôde reconhece
A firma foi arrombada
Sumiu um carregamento
Segunda de madrugada
XI
O dia já clareando
Todos já embriagados
Boca Pôde sugeriu
Cada um conta um pecado
Zé Pinguela disse logo
O sítio não foi comprado
XII
O sítio era de Quitéria
Viúva bem apanhada
Trabalhei como vaqueiro
Durante uma temporada
Se escavar o quintal
Vai encontrar a ossada
XIII
Vigia de cemitério
Chico Bufa faz agouro
Defunto rico velado
Com boca cheia de ouro
Ajuda botar na cova
Espera acabar o choro
XIV
Ajudante do vigário
Ruela como é chamado
Passa a sacola na missa
Faz seu voluntariado
Metade vai pra igreja
Metade vira pecado
XV
Boca Pôde em soluços
Da surpresa revelada
Contou do seu parentesco
Com a viúva assassinada
Quitéria da boca pôde
Noutra família criada
XVI
Sol raiado noite some
Roupa suja foi lavada
Fizeram pacto cerrado
Morrer de boca fechada
Quem quebrar o juramento
Não atravessa a calçada
XVII
Pinguela recebe carta
Boca Pôde é o autor
Querendo parte do sítio
Que sua irmã lhe deixou
Pense bem caro Pinguela
Quitéria você matou
XVIII
Pinguela logo recebe
Um fiscal da Prefeitura
Cobrando imposto atrasado
Exigindo a escritura
Aqueles três desgraçados
Vão parar na sepultura
IX
No outro dia bem cedo
Pinguela foi à capela
Contou tudo pro vigário
Dos pecados de Ruela
Que rezou quarenta dias
Pra pagar sua mazela
XX
No portão do cemitério
Um cartaz assim dizia
Cuidado com seu defunto
Não confie no vigia
Ele rouba até as calças
Não deixa raiar o dia
XXI
Sabe-se que Boca Pôde
Teve tempo abreviado
Bufa morreu de tocaia
Pinguela morreu queimado
Sem as mãos de pegar dízimo
Ruela foi enterrado
XXII
Que triste sina tiveram
Destino amaldiçoado
Melhor seria que nunca
Tivessem se encontrado
Promessa de Pinguelinha
Seu pai seria vingado!!!!
PRESSA DE CHEGAR
Ainda jovem pensei
Melhor é chegar primeiro
Aprendi que o atalho
É caminho mais ligeiro
II
Na procura me perdi
Me embrenhei no nevoeiro
Dei muitas voltas em mim
Acabei num atoleiro
III
Rodei mundo procurando
A curva do cotovelo
Passei rios mata virgem
Com bravura de guerreiro
IV
Carapuça minha casa
Orelha meu travesseiro
Chinelo gastou a sola
Mundana pegou dinheiro
V
Cachimbo levou consigo
A brasa do candeeiro
Destino ficou incerto
A vida virou novelo
VI
Ja dei por mim afogado
Com água no tornozelo
Tempo gasto na corrida
Me custou muitos janeiros
VII
Agora peguei o leme
Acordei o timoneiro
Traçado novo caminho
Virei proa do veleiro
VIII
Hoje conduzo meu barco
Como o velho marinheiro
Não força que arrebenta
Não lava que sai o cheiro
IX
Se quiser chegar na frente
Não pule seu companheiro
Devagar se vai ao longe
Sapiência de mineiro
X
Na ânsia de chegar logo
Tropecei no paradeiro
Sentado sobre o destino
Caminhei o tempo inteiro!!!
O VELHO ZECA
O meu Velho é mesmo forte
Faz versos de todo jeito
Pegou todos de surpresa
Levando tudo no peito
Apesar do corpo lento
Demonstrou muito talento
Que beleza de sujeito
II
Parecia expirado
Ninguém lhe dava suporte
Aos poucos foi se mostrando
Dando conta do seu norte
Usando a experiência
Pois o tempo é sapiência
No mais fraco e no mais forte
III
Poeta foi se forjando
Embora despercebido
Quase desacreditado
Alguém lhe daria ouvido
E foi tocando a toada
Juntando pouco com nada
Rimando quase escondido
IV
O povo foi percebendo
Que o Velho levava jeito
Quem via suas escritas
Lhe elevava o conceito
Isso lhe fortalecia
E o poema saía
Como se tirar um eito
V
De poema em poema
O Velho Zeca se fez
É poema todo dia
É poema todo mês
Hoje é considerado
Até fora do Estado
Seu livro já tem freguês!!
BRILHO DE ESTRELA
Beleza que se derrama
Labareda de fogueira
Só a chuva passageira
Faz gozo na tua chama
A água quase reclama
De secar rapidamente
No calor da pele quente
Arrepio muito breve
O vento ainda se atreve
Esvoaçar teu cabelo
Tratado com tanto zelo
Molhado da chuva fina
O teu corpo de menina
Revela flor da idade
Faz pouco da tempestade
Derramando juventude
O vento que te ajude
Não te sopre muito forte
Não te seque toda sorte
Que nem precisas agora
Sapateias nas amoras
Displicente, descuidada
És musa, predestinada
Serás rainha candura
Com essa beleza pura
Escultura do desejo
Um dia ainda te vejo
Sapatear nas estrelas
E apagar todas elas
Que ninguém sentirá falta
Aí, serás a mais alta
Com teu brilho reluzente
Uma estrela incandescente
De causar inveja à lua
Por fim a imagem tua
Ornada de diadema
Sairá do meu poema
Pra viver no firmamento
Fruto do meu pensamento
Devaneios de poeta!!!
AMORES DISTANTES
Os amores separados
Se alimentam da espera
Coração se desmantela
Doendo, despedaçado
Querendo ficar do lado
Da sua outra metade
Saudade que nos invade
Distância que nos impede
Vontade que não se mede
Desejo que não se apaga
Tomara o vento te traga
Pra perto da minha casa
E encoste minha brasa
Junto do teu estopim
Aí o fogo de mim
Te abraça, te consola
Te cobre de labaredas
Te consome, te devora!!!
AMOR DE JANGADEIRO
Veleiro partiu suave
Coração quase me mata
Meus olhos se desbotaram
São nascente de cascata
Retina presa no fundo
Dos olhos daquela ingrata
II
Me lancei de jangadeiro
Naveguei noites a fio
Procurei de mar a dentro
Um imenso desafio
Até onde alcança a vista
Nem sombra do seu navio
III
Vento aponta os olhos dela
Pra enchente da maré
Sopra vento de retorno
Com a força que puder
Faz a onda que lhe traga
Arrebentar no meu pé
IV
Vento que sopra na onda
Que devolve os afogados
Sopra bem devagarzinho
Manda a brisa pro meu lado
Me afoguei nos olhos dela
Me deixou enfeitiçado!!!
AMOR DE TODAS AS FORMAS
Amor que dura uma vida
Amor que passa ligeiro
Amor que sara ferida
Amor que custa dinheiro
II
Amor de mãe e de pai
Amor pra toda família
Amor que no samba cai
Amor do rádio de pilha
III
Amor de pai para filho
Amor que não se esgota
Amor que bota nos trilhos
Amor que filho não nota
IV
Amor que faz serenata
Amor que te manda flores
Amor que é pura cascata
Amor que só causa dores
V
Amor que não poderia
Amor feito sem cuidado
Amor de forma vadia
Amor que foi enganado
VI
Amor que seca teu pranto
Amor que tira teu sono
Amor que vem ao encontro
Amor que cheira abandono
VII
Amor que nem se consuma
Amor deixado de lado
Amor de quinze pra uma
Amor que chega atrasado
VIII
Amor feito no capricho
Amor que nem acontece
Amor deitado no lixo
Amor que não te merece
IX
Amor que gosta de briga
Amor que não se penteia
Amor que só faz intriga
Amor de barriga cheia
X
Amor de pura beleza
Amor que sobra do peito
Amor que trás incerteza
Amor que não leva jeito
XI
Amor feito de pureza
Amor inescrupuloso
Amor que não tem tristeza
Amor que fica ocioso
XII
Amor chegado de longe
Amor com pouco refino
Amor sagrado de monge
Amor de homem cretino
XIII
Amor do tipo maduro
Amor que chora calado
Amor que passa do muro
Amor de fogo trocado
XIV
Amor que sonha cativo
Amor rasgado profano
Amor feito sem motivo
Amor que vem todo ano
XV
Amor que foi combinado
Amor de todo fingido
Amor que foi rejeitado
Amor que restou traído
XVI
Amor que conta vantagem
Amor sublime de santo
Amor daquela viagem
Amor deixado no canto
XVII
Amor que vive escondido
Amor mantido em segredo
Amor calado, contido
Amor que morre de medo
XVIII
Amor comprado na feira
Amor que beira calçada
Amor sem eira nem beira
Amor de carta marcada
XIX
Amor que conta minutos
Amor que rebola a saia
Amor que fica de luto
Amor que morre na praia
XX
Amor contado no livro
Amor passado no dia
Amor moleque atrevido
Amor feito hemorragia
XXI
Amor de cara-metade
Amor que faz sentinela
Amor feito sem maldade
Amor de moça donzela
XXII
Amor de adolescente
Amor que vem do perfume
Amor que cheira bebida
Amor que é puro ciúme
XXIII
Amor que volta pra casa
Amor que some no mundo
Amor com fogo de brasa
Amor meio vagabundo
XXIV
Amor coberto de ouro
Amor que morre de fome
Amor que guarda tesouro
Amor que nem sei o nome
XXV
Amores pirateados
Amores fora das normas
Amores trancafiados
Amor de todas as formas!!!!
AMOR DE RAIZ
Ele, rebento minguado
Parteira fez sentinela
Angu foi sua dieta
Olhos presos na panela
Criado como batata
Em beira de corrutela
Ausente de sobrenome
Entupido de mazelas
II
Ele, criança sonhada
Primeira maternidade
Filmado dentro do ventre
Pequena celebridade
Chegada com muita festa
Anúncios pela cidade
Protegido no silencio
Do vento, da claridade
III
Ele, brinca na areia
Do chão de terra batida
Sem roupa sem preconceito
Sem saber de outra vida
Sem brinquedo sem cuidados
Só a sina a ser cumprida
Vida lhe monta de espora
Vai lhe abrindo feridas
IV
Ele, tem até mucama
Que não lhe deixa chorar
Se chora tem doce colo
Tem cantigas de ninar
Roupas finas delicadas
Mamadeira de manjar
Casa cheia de brinquedos
E a vida pra brincar
V
Ele, já carrega água
Já capina no roçado
Pés descalços nos espinhos
Ganhou calção de riscado
Menino de couro grosso
Parece determinado
Quando crescer quer comprar
Um chapéu e um machado
VI
Ele, domingo no parque
Brincando de escorregar
Algodão doce e pipoca
Carrossel a lhe rodar
Nada lhe falta na vida
É só pedir pra babá
Quando crescer certamente
Nem sabe o que quer comprar
VII
Ele, brinca do seu jeito
Subindo na goiabeira
Seu cavalo pau de lenha
Deixa todos na poeira
Pra ele é maravilhoso
Desabalada carreira
Não conhece nem inveja
Qualquer outra brincadeira
VIII
Ele, tem tv no quarto
Notebook e celular
Seus carrinhos de brinquedos
Já não pega pra brincar
Não escuta o que lhe dizem
Já responde pra babá
Come da melhor goiaba
Que a goiabeira dá
IX
Ele, falta na escola
Ajuda sua mãe na feira
A vida mais dura ainda
Lhe tirou da brincadeira
Com esse peso nas costas
Vai ter que subir ladeiras
É hora de separar
O vinho da mamadeira
X
Ele, tem tudo que quer
Mimado até o pescoço
As meninas da escola
Disputam no alvoroço
Quem vai fazer a lição
Entrar na casa do moço
Da fruta que ele come
O outro come o caroço
XI
Destino lhe foi ingrato
Vai ter que suar dobrado
Quem nasce pra capoeira
Nunca passa de roçado
Tem que ser muito tinhoso
Destino jogar pro lado
Correr mundo procurando
Seu chapéu e seu machado
XII
A pesar do alvoroço
Ele se comporta bem
Não esnoba não debocha
Mas sabe a força que tem
Sempre no final das contas
Escolhe a que lhe convém
Melhor aluna da classe
Melhor amiga também
XIII
Parte pra cidade grande
Pra fugir do que tem feito
Naquela vida sofrida
Teria que dar um jeito
Sua mãe vive de reza
Coração ta no estreito
Noticia sempre pequena
Saudade fora do peito
XIV
Apesar de bom garoto
Adolescente feliz
Se sente entediado
Não é a vida que quis
Bota mochila nas costas
Foge pra onde não diz
Seus pais caíram de quatro
Lendo recado de giz
XV
Trabalha de balconista
De pedreiro, de servente
De carteiro de vigia
De soldado de escrevente
Manda carta para a mãe
To aqui virando gente
Um dia você descansa
E vai sentar no batente
XVI
Andou por todos os lados
Levou pancadas da vida
Soube que sem o trabalho
Ninguém merece comida
Descobriu como é pequeno
Quando estava sem guarida
Entendeu que a família
Não tem porta de saída
XVII
Recebe carta de casa
Sua mãe caiu doente
Esgotada do trabalho
Da lida, do sol ardente
Sua barraca de feira
Sua alma, seu batente
Metade da sua vida
Se foi assim de repente
XVIII
Voltou pra casa sem graça
Mochila toda rasgada
Roupa suja das andanças
Auto-estima arrebentada
Suas lágrimas mostraram
A saudade escancarada
Abraço de pai e mãe
Não carece dizer nada
XIX
Sua mãe era valente
Nunca ficava parada
Agora sem o trabalho
Deve estar desesperada
Se ele larga o emprego
Não manda sua mesada
Que fazer com essa carta
Situação complicada
XX
O homem não necessita
De acumular riqueza
Quando tem muito dinheiro
Costuma subir na mesa
Olha pra gente de cima
Com olhos de avareza
Isolado no seu mundo
Muro alto da nobreza
XXI
Resolve voltar pra casa
Tesouro foi alvejado
Nada lhe vale tão caro
Seu sonho foi adiado
A saudade pula montes
O amor vira tornado
Chapéu quebrado na testa
Depois compra seu machado
XXII
Os valores se confundem
Com os bens materiais
Um chapéu e um machado
Parecem coisas banais
Quem toma sol no iate
Acha graça do rapaz
Quem tem o sol de castigo
Sabe o calor que lhe faz
XXIII
O pote de água fria
É a sua geladeira
O pirão da sua mãe
É coisa de feiticeira
Vai casar com a Maria
Namoradinha da feira
Cuidará da sua mãe
Sua velha companheira
XXIV
Raízes bem definidas
No rapaz da corrutela
Apesar da vida dura
Não aparenta seqüela
Abre mão do seu futuro
Tira a janta da goela
Egoísmo passa longe
Só não passa o amor dela!
XXV
O rapaz de pele fina
De gravata importada
Visita os pais mensalmente
Agora em nova morada
Leva presentes bonitos
Diz que não lhes falta nada
Quem gastou vida por ele
Passa as horas asilada
Não teve o amor de volta
Acabou interditada!!!
CASA VELHA
Casa velha hospitaleira
Recanto de todos nós
Teto dos nossos avós
Velha senhora querida
II
Já se foram tantas vidas
E tu aí feito louça
Jeito de menina moça
Parece dona do tempo
III
Casa velha bajulada
Rodeada de carinho
Morada de passarinho
Rouxinol dorme na sala
IV
Gigantes carnaubeiras
A te fazer companhia
Te protegem noite e dia
De raios e trovoadas
V
O velho gurgurizeiro
Terreiro de galamá
Leva a vida a pastorar
Quem tira peixe do rio
VI
O vento que te embala
Que te sopra o dia inteiro
Fustigante sorrateiro
Penetra na camarinha
VII
O rio no seu namoro
Quando te lambe o batente
Sempre deixa de presente
Uma lagoa de ouro
VIII
Casa de tantas serestas
Luaradas e fogueiras
Moças de boas maneiras
Tomavam banho de lua
IX
Deixei nome no reboco
Da tua velha parede
Cochilei na tua rede
Noutro dia fui embora
X
Quisera tu me tocastes
De herança de quinhão
Não sabes quanto me tocas
Se tombares pelo chão
No fundo, nas entrelinhas
Tuas paredes são minhas,
Paredes do coração!!!
FRASES
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Na solidão, uma torneira pingando serve de companhia!
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Dias sim, um livro aberto; dias não, impenetrável!
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Ponha-me livre e me terás por inteiro!!
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O Amor é como o Mar, imutável, imensurável!
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Quanto dista meu Amor de mim, se a vida muda sempre de caminho!?
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Teus braços são vigas no meu telhado, são redes no meu alpendre!
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A vida é um grande carrossel; hoje não te vejo, amanhã te tiro o véu!
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Se você trabalha além da conta, alguém vai gozar no seu esforço!
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Se queres ser acarinhado, prepara-te para merecê-lo!
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O calor do teu coração é a minha felicidade!
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Molestamos o mimado quando a culpa é de quem mima!
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O meu Amor vive a me lamber, as feridas e os pensamentos!
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Tomara o vento te traga pra perto da minha casa!
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A cada passo deixo um pedaço!
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Quem tem dinheiro guardado, trabalha no feriado!
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Abominavel a maldade, a falsidade e a mediocridade!
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Não acordo meu amor, por menos de uma flor!
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Não adore tanto a coisa, importante é a pessoa!
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A Liberdade é o Combustível do Caminhar!
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Sou raso de ambição, mas largo de opinião!
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O amanhã tem olhos cegos, só lhe sabemos ao anoitecer!
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A opinião e a vida são bens indisponíveis!
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A MULHER DA MINHA CASA
Teu dia é dia santo
És santa todos os dias
Tens nos olhos a Magia
No rosto suave encanto
Teus braços são acalanto
Teu colo pluma macia
Tuas mãos acariciam
Meu corpo na madrugada
Falamos sem dizer nada
Confundimos nossas bocas
Embaralhamos as roupas
A desatar nossos laços
Combinamos um abraço
No perfume do teu leito
Ancorado no teu peito
Nos teus lábios suculentos
Que roubam meus pensamentos
Sorriso de feiticeira
À noite mulher faceira
De dia manda na casa
Consciente que arrasa
Camarada, companheira
Madura cheia de prosa
Combatente, generosa
Nem sei se mereço tanto
Teus cuidados, teu encanto
Minha sombra minha vida
Minha alma prometida
És a tela no cinema
A dona do meu poema
Sem ti, sou pedra perdida!!!
METADE
Metade do que sonhamos
Não acontece de fato
Metade vira concreto
Metade fica no prato
De fato é só um sonho
Vira nuvem de fumaça
Vagueia no abstrato
Não olha por onde passa
Metade que mora longe
Não sabe do meu lamento
É sonho que me consome
Metade que eu invento
Outra metade do mundo
Não acha sua metade
Metade se desencontra
Outra vive de saudade
Metade que me navega
Ancora no meu veleiro
Me toma de sobressalto
Na pedra do marinheiro
Metade, minha metade
És o meu sonho de fato
Causa da minha procura
O outro pé do sapato
O espaço na moldura
Metade do meu retrato!!!
sábado, 23 de janeiro de 2010
UM SONHO DENTRO DO OUTRO
Sonhei que estava sonhando
E acordei de repente
Não na casa aonde moro
Mais num lugar diferente
Sonho sem pé nem cabeça
Parece de trás pra frente
II
Todo mundo me olhava
Como se eu fosse culpado
Tomara que seja um sonho
Eu disse preocupado
Nesse sonho to dormindo
No outro to acordado
III
Parece to num buraco
Que nunca chega no fundo
Que sonho maluco é esse
Será que estou moribundo
Quero acordar e não posso
Estou num sono profundo
IV
No alvoroço acordei
Ainda estava sonhando
E pela segunda vez
As pessoas me olhando
Não é possível, pensei
Eu devo ta delirando
V
Dizem que quando sonhamos
A mente vai passear
O corpo fica à deriva
Somente pra respirar
É corda sem a caçamba
Caniço sem samburá
VI
Um sonho dentro do outro
É atrasado sonhando
Só me livrei do sufoco
Com o telefone tocando
Me levantei de repente
E os olhos daquela gente
Era o meu chefe ligando!!!!
OS OLHOS DELA
Seus olhos são duas pedras
De brilho paralisante
Deviam ficar guardados
Como ficam os diamantes
Seu brilho é tão fulminante
Minhas pernas bambearam
As batidas aumentaram
Fiquei sem fala na hora
Ela já tinha ido embora
Eu ali desconsolado
Por causa de um olhado
Que aquela moça me deu
Ela desapareceu
Com seu olhar de quebrante
Só me vi por um instante
Na retina reluzente
Procurei na minha mente
Um brilho pra comparar
Das estrelas, nem pensar
Da lua cheia talvez
Mas, nunca o brilho que fez
Se repete novamente
Agora vivo silente
Procurando pela vida
A moça desconhecida
Qual rosto não pude ver
Quando começa a chover
Espero na tempestade
Seus raios de claridade
Acho que é a tal moça
Na água que forma poça
Vejo seu rosto na lua
É sonho que continua
A me fazer seu escravo
Eu que era homem bravo
Vivo agora de lamentos
Corre nos meus pensamentos
Noutro mundo procurar
Algo que possa matar
Esse mal daquele olhado
Ou então reencontrar
Aqueles olhos malvados
Por fim morrer fulminado
Nos raios daquele olhar!!!
O POETA E O CIGANO
Era uma vez um poeta
De casamento marcado
Sua amada foi com outro
Um cigano mal falado
Poeta perdeu o rumo
Cigano foi premiado
II
Seu verso caiu doente
A rima perdeu sentido
Por onde o poeta passa
Tem cochicho de ouvido
Desejo levou a moça
Amor caiu abatido
III
Poeta peito sangrando
Perdeu o gosto da vida
Nada mais lhe importava
Faltava sua querida
Partiu à procura dela
Pelo mundo sem guarida
IV
Cigano sem paradeiro
Qualquer lugar é morada
Sua casa é a natureza
Já nasceu nessa toada
Tomando banho de rio
Com a nova namorada
V
Os ciganos e leões
São de fato parecidos
As mulheres na labuta
Os homens noutro sentido
Moça logo demonstrava
Que tinha se arrependido
VI
Cigano muito valente
A todos metia medo
Numa cabana de palha
Debaixo dum arvoredo
Instalou-se com a jovem
Foi falando sem segredo
VII
Sou domador de mulheres
Agora faça o que digo
Você vai fazer dinheiro
No cabaré de castigo
Os seis dias da semana
Domingo fica comigo
VIII
Seja dia ou seja noite
Não recuse freguesia
Receba bem o cliente
Demonstrando alegria
O dinheiro apurado
Recolho no fim do dia
IX
A jovem então sentiu
A terra faltar nos pés
Lembrou-se do seu poeta
Vida cheia de viés
Passarei de mão em mão
Nas camas dos cabarés
X
Enquanto isso ocorria
O poeta sem guarida
Procurava sua amada
Em terra desconhecida
Sem saber da sua sina
Agora mulher da vida
XI
Poeta não costumava
Fazer trabalho pesado
Nas andanças pelo mundo
Teve que comer dobrado
Passou fome passou frio
Sofreu qual um condenado
XII
Certa noite teve um sonho
Sua amada lhe dizia
Preciso da sua ajuda
Me tira dessa agonia
Resolveu voltar pra casa
A saudade lhe batia
XIII
A jovem moça vivia
Regime de escravidão
Virou um trapo de gente
Orgulho a baixo do chão
Cigano só na orgia
Dá carta e joga de mão
XIV
O poeta de regresso
Parou um dia bem cedo
Numa cabana de palha
Debaixo dum arvoredo
Sentiu um forte arrepio
Arrepio de dar medo
XV
A cabana abandonada
Perto da beira do rio
Serviu de ninho profano
Disse ele quando viu
Um pé de chinelo dela
Ser coração se partiu
XVI
Beijou o pé de chinelo
Da sua mulher amada
Montou no seu alazão
Coração em disparada
Partiu a todo galope
Cavalo comendo estrada
XVII
Chegando no povoado
Como todo forasteiro
Procura a casa das moças
Carinho pelo dinheiro
Pediu uma boa cama
Com moça de travesseiro
XVIII
Pela dona do bordel
Poeta foi conduzido
Sua moça não demora
Está botando vestido
A moça entrou no quarto
O poeta adormecido
XIX
Acordou de sobressalto
A camareira lhe chama
Do lado da sua roupa
Um bilhete sobre a cama
“Da garupa do desejo
Caí de cara na lama”
XX
O poeta reconhece
A letra da sua amada
Na mente passou o filme
Da procura obstinada
Valeu a pena o esforço
Acabou a caminhada
XXI
Quero falar com Maria
Disse ele à camareira
Hoje é domingo seu moço
Trabalha de cozinheira
É festa da ciganada
Só volta segunda feira
XXII
Tem um grande acampamento
Na saída da cidade
Lá cozinhei muitos anos
Nos tempos de pouca idade
Agora é vez de Maria
Suportar essa maldade
XXIII
Não tenho nada a perder
A vida me foi ingrata
Vou lhe provar que poeta
Não tem sangue de barata
Hoje eu mato um cachorro
Ou o cachorro me mata
XXIV
O cigano era cacique
Na região afamado
O pai de moça bonita
Por ele subjugado
Ou trabalhava pra ele
Ou morria assassinado
XXV
O sol já ia baixando
Quando o poeta chegou
Mata fechada protege
A visão do bangalô
Ciganos se despedindo
A festa já acabou
XXVI
Maria feito criada
Saiu na porta da frente
Poeta fez um sinal
Dos tempos de adolescente
Maria tremeu na base
Ficou muda de repente
XXVII
Não sabia da coragem
Do poeta forasteiro
Resolveu naquele instante
Bastava de cativeiro
Fez um sinal positivo
Pro seu amor verdadeiro
XXVIII
Pegou uma carabina
Que costumava limpar
Cigano chamou Maria
Sua puta vem deitar
Poeta tomou a arma
Cigano vai me pagar
XXIX
Poeta foi casa a dentro
Cigano não esperava
Apontou a carabina
Maria lhe acompanhava
Eu sempre sonhei, um dia
A tua hora chegava
XXX
Vais pagar o sofrimento
De todas as prostitutas
Que de moças de família
Tu transformastes em putas
E a vida dos seus pais
Tiradas na força bruta
XXXI
Sapecou tiro certeiro
No meio do coração
O cigano poderoso
Caiu de cara no chão
Poeta levou Maria
Montado em seu alazão
XXXII
Perdão foi feito pra dar
Todo mundo erra um dia
Poetta preparando
Seu livro de poesias
Rancores fora da mente
A vida é daqui pra frente
O Poeta e a Maria!!!
NAZARÉ
Morre Nazaré
Valente senhora
De tantas histórias
Quase centenária
Sorriso por nada
Risada de graça
Vendia alegria
Figura lendária
Me lembro a cadeira
A espuma gelada
A Gilete cega
Cabeça raspada
Cabelo e piolhos
No chão de tijolo.
Agora cansada
Tesoura guardada
Resolveu partir
Pra não voltar mais.
Nazaré, Mulher,
Que corta os cabelos do mundo,
Descanse em paz!!!!!
MINHA TERRA
Na minha terra tem coisas
Com nomes bem diferentes
Estranha quem vem de fora
Costumes da minha gente
Vou ver debaixo das unhas
Se me lembro de algumas
Pra botar nesse repente
II
Mutamba fruta de ferro
Ninguém lhe quebra no dente
Pau-do-rio é azedinho
Aparece na enchente
Pitomba desce direto
Goití entala a gente
III
Gurgurí engrossa a língua
Guabiraba na floresta
Canapum da na vasante
Cajú verdoso não presta
Croatá retalha a boca
Explode fazendo festa
IV
Cacimba poço de água
Cumbuca grande cabaça
Imbira tira da palha
Tucunzeiro não se abraça
Rabichola no cavalo
Lamparina que fumaça
V
Catolé da espingarda
Gibão roupa de vaqueiro
Caco pra fazer grolado
Gigolé prende o cabelo
Cambiçote quebra ovo
Tijubina pé ligeiro
VI
Finurita rapadura
Enfiada no frexal
Brêdo entra na frieira
Tertulha na matinal
Intã que vem na mareta
Peixe seco no varal
VII
Tunico dança mazuca
Guarda a masca no chapéu
Generino tem açude
Todinho cheio de mel
Abel Tiadosa Araujo
Foi o nosso menestrel
VIII
Massaranduba, canema
Riacho, Lagoa Salgada
Fim da légua, Poço Doce
Cancela, Beira Rapada
Timbaúba, Croa Grande
Mexera Doce, Ramada
IX
Macajuba, Itarema
Jericoacoara, Capim
Pizunha, Poço da Onça
Caiçara, Camocim
Angico, Genipapeiro
Gijoca, Tabulerim
X
Unha de Gato, Melosa
Mata-parte, Catingueira
Berduégua, carnaúba
Mucurana, Aroeira
Grão de galo, carrapicho
Oiticica, Marizeira
XI
Pilombeta, garajuba
Cari bodó, Aniquim
Mane besta, cangatí
Curimatã, camurim
Tamatarana, parum
Biquara, camurupim
XII
Juriti, papa-lagarta
Currupião, Maçarico
Cibite, Canário sujo
Piririguá, tico-tico
Quem-quem, cabeça de fita
Graúna do bico-rico
XIII
Falei das plantas e peixes
Das frutas dos animais
Lugarejos, passarinhos
Costumes e tudo mais
População de artista
Cada um mais humorista
Faz rir de cair pra trás!!!
MEDO DA NOITE
A noite é misteriosa
Povoada de segredos
No meu tempo de criança
Procurava dormir cedo
Par não ouvir as historias
Que sempre metiam medo
Geralmente tinha alma
Saindo do arvoredo
II
Agora namoro a noite
O medo ficou pra trás
A noite é minha aliada
Me restaura e tudo mais
Se o dia um dia sabe
O bem que a noite faz
Perde a hora todo dia
Vira ébrio contumaz
III
A noite me lambe os olhos
Me tira coisas da mente
Salpicadas pelo dia
Nos olhos de tanta gente
Na hora do seu hiato
É voluntária silente
Nas calçadas nos albergues
No sono dos indigentes
IV
Noite que me aconchega
Me afaga me aquece
Anoitece, escurece
Me conforta me adormece
Me dorme me conta sonhos
Me domina me entorpece
Passa a noite de vigília
Só dorme quando amanhece
V
Dizem que dia e noite
Tinham encontro marcado
O dia passou na tarde
Chegou um pouco atrasado
A noite que dorme cedo
Já tinha se levantado
Efeito do desencontro,
Noite e dia separados
VI
A noite ficou sentida
Não esquece até agora
O dia se aproxima
A noite vai logo embora
Sei que aos olhos do dia
A noite não se demora
Só se for de manhãzinha
No troca-troca da hora
VII
Noite amiga e companheira
Que esconde os namorados
Não esqueço aquela noite
Aquele beijo gelado
Ela lenço na cabeça
Eu chapéu todo molhado
Troquei a flor do desejo
Pelo medo do passado!!!
FARINHADA
Maniva finca na terra
A chuva que vem molhar
Demora fazer raiz
Na hora de arrancar
Acorda de madrugada
Todo mundo a trabalhar
II
Cangaia bota no burro
Cambito bota madeira
Caçuá de mandioca
Da raspa sobra a crueira
Puxa roda bota prensa
Escorre manipueira
III
Massa prensada no coxo
Namorando na peneira
Forneiro torra farinha
Tapioca sai ligeira
Durante o dia rapando
À noite mulher faceira
IV
Noite escura só se ouve
Cochichos e brincadeira
Disseram que viram gente
Sumindo na capoeira
Quem puxou roda merece
Um dengo da rapadeira
V
Escuridão camarada
Ninguém sabe ninguém viu
Somente no outro dia
Descobrimos quem sumiu
A mulher pisca de olho
O homem no assobio
VI
Acabada a farinhada
Farinha pra muito tempo
Faca cega roda torta
Promessa de casamento
Manipueira malvada
Escorreu matou jumento
VII
Farinhada é o evento
Mandioca é o produto
Processo torna farinha
Alimento do matuto
Quem gostou da farinhada
Espero não dê risada
A jumenta está de luto!!!
A PESCARIA
Velho Zeca certo dia
Marcou uma pescaria
Botar rede na camboa
Tio Quincas também ia
Eu fui montado no jegue
O diabo que te carregue
Toda hora eu caía
II
O lugar era de mangue
Do outro lado salgado
Nem um pé de vassourinha
Pra se esconder do tornado
Caiu uma tempestade
Deus do céu por caridade
Fiquei todinho enrugado
III
Menino ainda pequeno
Fiquei debaixo do jegue
Tentando esconder da chuva
Um frio que arrenegue
Depois entrei num caixote
Emborquei no meu cangote
Ao trovão fiquei entregue
IV
A pescaria rolava
Maré cheia foi baixando
A chuva não dava trégua
O peixe foi encostando
Camboa toda fechada
Depois da água baixada
Os pemas foram chegando
V
E quando a maré baixou
Menino foi coisa feia
Peixe tentando voltar
Encalhava na areia
Pema parecia praga
E o cacete do chaga
Cobria eles de peia
VI
Era pra mais de quarenta
Na cabeça de menino
Coitado daquele jegue
Que era tão pequenininho
Peixe arrastava no chão
Quando chegamos então
Que inveja dos vizinhos
VII
Só sei que uma cabeça
Deu pra jantar todo mundo
Seis irmãos e os meus pais
Que comem no prato fundo
Sem contar as barbatanas
Comemos duas semanas
Terreiro ficou imundo
VIII
Um certo dia em São Paulo
Contei pro primo Messias
Que o meu pai tinha feito
Uma grande pescaria
Messias meio sapeca
Perguntou pro Velho Zeca
Que disse que não sabia
IX
Pra mim o pema era enorme
Que grande decepção
Velho Zeca pôs o dedo
Aonde começa a mão
Aí era pilombeta
E minha grande falseta
De repente foi ao chão
X
Me sentindo inconformado
Tio Quincas fui visitar
Aquilo não tava certo
Ele iria confirmar
Sentados naquela mesa
Qual foi a minha surpresa
Disse nunca fui pescar
XI
Essa história é verdadeira
Messias vai confirmar
Resposta pro Velho Zeca
Galope vou lhe pagar
Seu galope não é xoto
Faz versos que nem garoto
Nos noventa eu vou pra lá!!!
DONA VALENTIA
Valentia, era seu nome
Pé rachado de chinelos
Rocha que quebra martelos
Passava pito na fome
Coragem maior que homem
Dorso largo de trabalho
Bota peito no retalho
Faz a roupa de quem fica
Esquece da moça rica
Que povoava seu sonho
Roubado porvir risonho
Se viu no redemoinho
Não era qualquer ventinho
Que metia medo nela
Tira vida da goela
Como faz o albatroz
Escorreu dentro de nós
Sua luta grandiosa
Não fosse tão corajosa
Seria coragem e meia
Pôs-se a tecer sua teia
Alinhavar nos rebentos
Expôs entranhas ao vento
Enclausurou sua alma
A perfurar sua palma
Com as agulhas do mundo
Desejo no poço fundo
Pra nunca mais ir buscar
Gastou a vida sem par
Interna, resignada
Até o fim da jornada
Colada nas suas crias
Já com as palmas macias
Com o dorso aliviado
Agora papéis trocados
Sob os olhos de Maria
Morre Dona Valentia
No leito que merecia
Rodeada de cuidados!!!
A ESPERA
O apito do trem que trás o meu bem
Vibra no meu ouvido feito sinfonia
Meu pobre peito nem sabe como bater
O desejo contido de anos a fio
Sai agora pelos poros e quase
Se derrama na plataforma
As mãos trêmulas e geladas
Traduzem minha alma guardada
Que de tanta espera não soube o
Tempo de cometer pecados
Tomara valha o amor,
O tempo que já se consumiu!!!
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