sábado, 4 de abril de 2020

CORONAVÍRUS MALVADO


















Já que tô de quarentena
Que devo ficar em casa
Vou aproveitar o tempo
Num cordel de cova rasa
Pedindo a todos os Santos
Pedindo ao povo da Nasa
Que invente uma engenhoca
Que asse vírus na brasa
               II
Um tal de Coronavirus
Desembestou pela terra
Da Ásia foi pra Europa
Devastando feito guerra
Atravessou continentes
Tá aqui no pé da serra
Basta um infectado
E o povo todo se ferra
              III
O mundo inteiro sentiu
Tamanha foi a surpresa
Um vírus desconhecido
Com fúria de correnteza
O povo despreparado
Sofrendo na incerteza
A doença corre solta
A saúde anda presa
               IV
O vírus vem do morcego
Que passou pro pangolim
Um animal de escamas
De aparência ruim
Sua carne é iguaria
La pras bandas de Pequim
Sua escama afrodisíaca
Bem que servia pra mim
                V
Outro diz qu’é do macaco
Do morcego ou coisa assim
Diz um monte de besteiras
Deve até comer capim
Emprega o tempo do povo
Com papo de “butiquim”
Não devemos dar ibope
Pra comentário chinfrim
              VI
Escuto tanta conversa
Que fico desconsolado
Um diz que o vírus foi
De propósito esparramado
De vingança de problemas
Na balança do mercado
Quem sabe furou o saco
Quando ia transportado
             VII
Ouvi que alguns países
Respirador já não tem
É gente pra todo lado
Ambulância vai e vem
Dentro da prioridade
O idoso não convém
Salva o moço que trabalha
Manda o velho pro além
             VIII
Em Bérgamo na Itália
Está faltando caixão
Os agentes funerários
Não suportam a lotação
Os corpos são carregados
Jogados no caminhão
Pros fornos das olarias
Pra fazer a cremação
              IX
Nestes tempos virulentos
De comoção social
Carece muito cuidado
Com notícia de jornal
Um diz que “isso” faz bem
O outro diz que faz mal
Siga só na recomenda
Do poder oficial
               X
Milhões de especialistas
Aparecem nessa hora
Um diz “da porta pra dentro”
O outro “porta pra fora”
O pobre, que não entende
Depressa se apavora
Se apega a todos os Santos
Roga por Nossa Senhora
              XI
É um tal de lava-mão
Lava-mão e lava-mão
Já estou preocupado
Com a falta de sabão
Não fui mais na padaria
Não fui mais no barracão
Nunca mais queimei o dente
Nunca passo do portão
              XII
Gente pobre e gente rica
Com medo do bicho feio
Gente que não se banhava
Agora pegou asseio
Autoridades do mundo
Usando tudo que é meio
Cientistas renomados
Nem isso lhe bota freio
            XIII
Que o vírus não se demore
Que não leve tantas vidas
Que sejamos pacientes
Com figuras repetidas
Todo dia a mesma coisa
Vidas e vidas perdidas
Além da perda doída
A perda sem despedidas
            XIV
Nunca fui encarcerado
Nunca matei um pardal
Agora com esse vírus
Tô na condicional
Não tenho tornozeleira
Mas temo meu funeral
Se acabar a comida
Como farinha com sal
            XV
Se você chegar da rua
Não abrace seu avô
O idoso é vulnerável
Como pétala de flor
Não convide pra visita
Orelha de cobertor
No final da tempestade
Vem o sol e seu calor
            XVI
Quando chega encomenda
Já fico sobressaltado
Talvez o entregador
Esteja contaminado
Lhe chamo de corajoso
Mais me mantenho afastado
Agradeço gentilmente
Mais fico desconfiado
            XVII
Será que veio na caixa
Então na nota fiscal
Na caneta, no recibo
Nas mãos dele, afinal?
Com medo da embalagem
Já rebolo no quintal
Se por acaso eu espirro
Ai Jesus....e coisa e tal            
           XVIII
Vou na caixa do correio
Pegar a conta de luz
Rogo a Deus, coronavirus
Que tu não chegue na Cruz
Já vivo na minha casa
Mascarado de capuz
Já está encomendada
Garrafada de mentruz             
            XIX
Eu que sou um beijoqueiro
Adoro pegar na mão
Me vejo desconcertado
Diante do meu irmão
Eu peço perdão a ele
Ele me pede perdão
Dois metros de separado
Não destrói a união
           XX
O vírus vai pela boca
Se aloja na garganta
Quando chega nos pulmões
Convém apelar pra Santa
A reza de pulutrica
De certo não adianta
Repila o coronavirus
Não lhe convide pra janta
           XXI
Aqui no nosso Brasil
Tivemos boa atitude
O povo faz homenagem
Aos agentes de saúde
Porém se entram no trem
O povo se torna rude
São expulsos do vagão
E acaba toda virtude
             XXII
Existe muitas doenças
Correndo no mundo afora
Mas nenhuma tem assombro
Como esse vírus de agora
Está sendo comparado
Com a gripe espanhola
50 milhões de mortos
Morria três mil por hora
             XXIII
Tomara que sua fúria
Perca força no caminho
Que não chegue em minha casa
Nem na casa do vizinho
Que apareça vacina
Com amargo que quinino
Que mate todos os vírus
Antes de sair do ninho
             XXIV
Talvez em poucas semanas
Meu medo tenha aumentado
Prevejo tempos difíceis
Vamos sofrer um bocado
Alimento se acabando
Com o preço triplicado
O dinheiro definhando
E o povo desesperado
             XXV
Tomara esteja enganado
Que nada disso aconteça
Qu’eu esteja variando
Com minhoca na cabeça
Que a rotina do povo
Enfim se restabeleça
Talvez com medo da Cruz
O vírus não apareça
            XXVI
Enquanto escrevo o cordel
As mortes vêm aumentando
O vírus que tava longe
Já está se aproximando
Já tem um caso suspeito
Por aqui me “arrudiando”
Tomara seja mentira
Já estou me confessando
           XXVII
Se você já é maduro
Idoso assim como eu
Aí que mora o perigo
Tamo no escuro breu
Não pode ir na igreja
Leva vida de ateu
Já sabemos que o vírus
Mata mais que Zébedeu
          XXVIII
Como faz esse corona
Uma coisa que não voa
Atravessar oceanos
Chafurdar minha camboa
Contaminar minha gente
De qualidade tão boa
Deve vir de passageiro
Na garganta da pessoa
           XXIX
Aqui na minha cidade
O povo se convenceu
Que não é uma gripezinha
Basta ver o Europeu
Todo mundo está em casa
Tanto ela quanto eu
Pelo menos até agora
Todo mundo obedeceu
            XXX
O medo faz sentinela
Na casa de todo mundo
Vivo no isolamento
Num sentimento profundo
Se me vem uma coriza
Já me sinto moribundo
Me botou trancafiado
Esse vírus vagabundo
            XXXI
Que o bom Deus ilumine
As nossas autoridades
E não permita que eles
Alimentem vaidades
O vírus também lhes pega
Sem dó e sem piedade
A paulada é a mesma
Pra toda sociedade   
           XXXII
Tem gente que bota um ovo
Com medo da pandemia
Pra outros ela não passa
De gripezinha vazia
Cuidado com sua língua
Não pregue boataria
Pois o vírus não escolhe
Classe ou categoria
          XXXIII
Ainda está no início
Aqui no meu Ceará
Certamente logo-logo
O vírus vai alastrar
Nós já temos o exemplo
Não podemos vacilar
Faça bem a sua parte
Pra mais tarde não chorar
          XXXIV
Todo dia o povo morre
Todo dia nasce mais
Depois do vírus corona
Muita coisa não se faz
Sem mais encontros furtivos
Como fazia os casais
Agora só pelo vídeo
Com medo das digitais
          XXXV
Já gastei a paciência
Enjoei televisão
Já reli todos os livros
Já bebi o garrafão
Uso máscara e luvas
Quando passo do portão
Meu cabelo tá horrível
Pelo medo do salão
         XXXVI
Já passa de 15 dias
Que estou de rouquidão
Já comi muita gengibre
Mastiguei o açafrão
Deus me livre da virose
Invadir meu alçapão
Por enquanto me defendo
Com cachaça e com limão
         XXXVII
Tivemos a Peste Negra
Em mil trezentos e tal
O transmissor era a pulga
Um minúsculo animal
Como um bicho tão pequeno
Pôde fazer tanto mal
Morava no seu cachorro
O anjo negro fatal
         XXXVIII
Nosso anjo de jaleco
Que arrisca sua vida
Contamina sua casa
Sua família querida
Tá virando paciente
Respiração assistida
Amanhã vai ser cremado
Sem reza e sem despedida
         XXXIX
Como nos outros países
Vamos ter a pandemia
O vírus se multiplica
Assim da noite pro dia
Não quebre o isolamento
Não renove companhia
Não fique pulando cerca
Pratique a monogamia
           XL
É triste ver logo cedo
Passar na televisão
Na porta do crematório
A fila de caminhão
Com o seu ente querido
Numa urna de caixão
E você trancafiado
Da garagem pro porão
           XLI
Tomara um vírus malvado
Mais malvado do que tu
Te queime na labareda
Do fogo do cunhaú
Extermine tua raça
Te transforme num angu
Que sejas finalizado
No bico do urubu          
           XLII
Ao povo de quarentena
Aponto minha atenção
Já não sabe o que fazer
Com tanta informação
Já sente claustrofobia
Com regime de prisão
Muita calma nessa hora
Tenha Deus no coração
            XLIII
Aponte seu pensamento
Para o bem do seu irmão
Que morre nos quatro cantos
Seja moço ou ancião
Se fizer a sua parte
Já fez uma boa ação
Na dor o povo se une
No amor, melhor então
            XLIV
Suspiro pra ir na rua
Desisto na mesma hora
Meus filhos, netos e netas
Não querem qu’eu vá embora
Família é tudo na vida
Principalmente agora
Resista com toda força
Lá fora o mundo já chora
           XLV
Já senti a quarentena
Já me deu ansiedade
Sinto falta dos amigos
De andar pela cidade
Estou fazendo de casa
As provas da faculdade
Todos princípios são flores
É a mais pura verdade
            XLVI
Não quero ser obrigado
A fazer outro cordel
Contando coisa pior
Desse vírus tão cruel
Estamos no fim de março
Não tem mais álcool em gel
O mês de abril promete
Vou fazer o meu papel
            XLVII
Que ninguém se aproveite
Pra dar calote também
Quando o vírus for embora
A justiça logo vem
Como ando esquecido
Esqueci do armazém
Me passa o número da conta
Q’eu te mando aqueles l00
            XLVIII
Do jeito que anda o mundo
Sem porta sem taramela
Com os parafusos soltos
Sem porca nem arruela
Talvez o medo nos sirva
Para fechar a cancela
Um freio de arrumação
Com palmada de chinela
            XLIX
Não que eu seja perfeito
Também estou incluído
Tantas vezes fui errado
Sem ficar arrependido
É que hoje vejo coisas
Que me deixa constrangido
Peço vênia e espero
A ninguém ter ofendido
               L
Às pessoas que resistem
Padecer na quarentena
Faça contagem dos mortos
Todo dia a mesma cena
Se alastrando pela terra
Tanto choro que dá pena
O vírus devasta mundos
Que nem a gota-serena!!!


domingo, 11 de agosto de 2019

MARIA & JOSÉ




             
Maria não dá bom dia
Não escuta quem apela
A porta da casa dela
Tem urtiga no mourão
É onça na contra-mão
Cuspindo brutalidade
Não gosta de amizade
Repudia gentileza
Mas a sua “buniteza”
Entope carroceria
             II
Um dia topei Maria
Com topete de mulher
“Malmente rastava os pé”
Como quem tá com azia
Lhe perguntei como ia
Só podia ir a pé
Me chamou de “caburé”
Na maior antipatia
Minha mãe já me dizia
Não cutuca jacaré
            III
Assim é, Maria José
Doçura de carrapicho
Arisca que nem um bicho
Se alguém se aproxima
Sua mãe já lhe ensina
Os “pirigo” da idade
Não aceita caridade
Nem recado nem bilhete
Finura de alfinete
Opinião de catita
             IV
A Maria era bonita
Um defeito não se via
Mocinha de sacristia
Só da igreja pra casa
Reimosa mais que a brasa
Que nem bico de chaleira
Eu levei na brincadeira
Sua ira de menina
Metade da minha sina
A Maria carregava
               V
Maria se transformava
Bonita que só o diacho
Fria que nem um riacho
Nas coisas do coração
Eu lhe botava atenção
Todo domingo na missa
Parecia uma noviça
Uma filha de Maria
Minhas perna se tremia
Quando espiava pra ela
             VI
Eu, comia na tigela
Ela, da roça também
Eu, não tinha muitos bem
Duas cabeça de gado
Tinha cavalo celado
Com arreio de metal
Tinha mais dois animal
Rematado no leilão
Um carneiro valentão
E uma porca maiada      
            VII
Maria era desejada
Por todos da redondeza
Parecia uma princesa
Nas quatro festa do ano
E José fazendo plano
Sonhando com sua mão
Uma rosa em botão
Abrindo pro infinito
Seu brinquedo favorito
Era o banho de lagoa
           VIII
Sabemos que tempo voa
Na vida de todo mundo
Maria por um segundo
Parece desabrochar
Já retém o seu olhar
Quando é observada
Já não nada descuidada
Como constante fazia
Como minha mãe dizia
Já tava de fogo aceso
             IX
Maria já dá o peso
Já suspira na janela
Preciso falar com ela
Sobre as minha intenção
Logo vem um gavião
Deitar olho na menina
Mamãe diz que nóis combina
Que dá pra fazer um par
Mais pra poder combinar
Ela precisa saber
            X
Esqueceu os afazer
Roçado não via Zé
Apiruando a Mazé
Aonde a menina ia
A paixão lhe consumia
Já não ia trabalhar
A roça por capinar
Amanheça e anoiteça
Não tirava da cabeça
A imagem de Maria
             XI
Maria bem que sabia
Que andava perseguida
Toda vinda toda ida
Dava com olho de Zé
Essas coisa de mulher
Que vê e faz que não viu
Mas no fundo já sentiu
O coração palpitar
A noite deu de sonhar
Com referida pessoa
             XII                              
Ele mora na Coroa
Ela mora no Vintém
Meio dia ela vem
Na garupa do seu pai
É a hora quêle vai
Do roçado pra lagoa
É sua hora mais boa
Quando se cruza com ela
Só falta cair da cela
Quando mira seu olhar
            XIII
Fuxico foram contar
De uma briga passada
Uma cerca derrubada
Desavença de vizinho
Por conta dum bacurinho
Foi parar no Promotor
Essa briga separou
Os Pinheiro dos Machado
Ele foi prejudicado
Por coisa que nunca fez
             XIV
Foi briga pra mais de mês
O pai dele e o pai dela
Foi arame foi cancela
Derrubados pelo chão
Uma grande confusão
Briga pra vuar os caco
Tocaram fogo em barraco
Emboscaram de tocaia
Foi um rabo de arraia
Não foi coisa de se vê
             XV
Zé Maria sem saber
Do bendito bafafá
Precisa desintrigar
O pai dela do seu pai
No mesmo dia ele vai
Na casa do seu cunhado
Que é alfabetizado
“Pra mode” lhe ajudar               
Pra poder se desatar
O grande nó que se deu
            XVI
Seu cunhado escreveu
Uma carta de perdão
Pedido de remissão
Pra casa do ofendido
Depois de escurecido
Enfiou pela janela
Caiu bem no quarto dela
Que achou quando “barria”
Ela também não sabia
Da intriga do seu pai
            XVII
Dia vem e dia vai
Um dia veio resposta
Também debaixo da porta
Seu pai o destinatário
Dizia o adversário
Não ter mágoa nem rancor
Seu pai se admirou
Do chamego do vizinho
Mas foi aberto o caminho
Foi derrubado o acêro  
            XVIII
Zé que era dos Pinheiro
E Maria dos Machado
Agora desintrigado
Bebia no mesmo pote
A Maria nos capote
O Zé tirando crueira
Dá com ela na peneira
Com as mão a se roçar
Pra questão cicatrizar
“Ajuntaro” as farinhada
            XIX
O Zé dava uma boiada
Pela menina Maria
Ele já não conseguia
Ficar sem os olhos dela
Para ele e para ela
Era coisa decidida
Só havia uma saída
Fizeram combinação
Comer do mesmo pirão
Pro resto da suas vida
             XX
O Zé, com a repartida
Que lhe tocou da farinha
Juntou a porca que tinha
Pras festa de fim de ano
Comprou um corte de pano
E mais um brinco de ouro
Uma tamanca de couro
De presente pra menina
Carregou na brilhantina
Que escorria na testa
              XXI
Chegou o dia da festa
Foram todos pra novena
Convidou sua pequena
Pra tomar um aluá
Pois tinha que lhe falar
Daquele corte de pano
Foi aí seu desengano
Uma facada no peito
Maria com muito jeito
Foi dizendo mesmo assim: 
             XXII
Ô Zé, se fosse por mim
Até casar eu queria
Eu lhe tenho simpatia
Só não quero caritó
Mais agora deu um nó
Nas combinança da gente
Diz que tem um pretendente
Lá das banda de Sobral
Dono de carnaubal
Que me viu pelo retrato
            XXIII
Maria não faça trato
Nem pela barba do santo
Nem pelo divino manto
Do Divino Pai Eterno
Prefiro ir pro inferno
Andar sem rumo no mundo
Me jogar num poço fundo
Deixar minha alma presa
Do que viver de tristeza
De coração trespassado
               XXIV                                              
No domingo retrasado
O meu pai “raiô” comigo
Mãe me botou de castigo
Diz que tô muito saída
Disse que fui prometida
Pra quando for de maior
Enquanto for de menor
A gente vai namorando
Inda falta quatro ano
Pra mode vim me buscar
            XXV
Tomara o velho gagá
Morra bem antes do dia
Que dê uma frente fria
Lá onde esse traste mora
Praga que tudo devora
Mate seu carnaubal
Que tudo vire mingau
Na vida do papangu
E uma praga de urubu
Devore sua carniça
           XXVI
Maria sem dá notícia
Se mandou pra Capital
Talvez passou em Sobral
Na companhia dos pais
O desgosto foi de mais
No peito de Zé Maria
Pois não veio a frente fria
Sua praga não pegou
Inda viu o seu amor
Saindo por entre os dedo
           XXVII     
José morrendo de medo
Quase doido de ciúme
Parecia um vagalume
Não dormia nem comia
Matutava noite e dia
Na espera do seu bem
Será que Maria vem
Ou fica pra lá de vez?
Não, depois do que ela fez
Lá na pedra do rochedo
            XXVIII
Já voltaram com segredo
Maria já me evita
Até voltou mais bonita
Com o cabelo frisado
Os peito mais volumado
Parece fruta madura
Por fora uma formosura
Por dentro já não garanto
Da conta do meu encanto
Quebrou cinquenta por cento
           XXIX
Uma ira de momento
Feriu o seu coração
José perdeu a razão
Abalado de ciúme
Maria não sai a lume
A espera lhe castiga
Zé não passa da urtiga
Que habita no mourão
Nunca foi no seu portão
Quanto mais um casamento
             XXX
O tempo passava lento
Pra agonia de Zé
Um dia viu um chofer
Andar perdido no mato
Num carro quatro por quatro
Procurando a casa dela
Escorou-se na cancela
Pra não cair fulminado
Era coisa de noivado
Voava seu sabiá
           XXXI
Só sei que pra encurtar
O velho desceu do carro
Com escarro de catarro
E cachimbo fedorento
Maria por um momento
Achou que fosse Fiscal
Do Imposto Federal
Querendo tirar dinheiro
Largou o véi no terreiro
Se trancou na camarinha
           XXXII
Maria inda não tinha
Conhecido o pretendente
Quando viu aquela gente
Não desconfiou de nada
Quando foi apresentada
Ingúiô no pensamento
Esse sujeito nojento
Não passa da minha sala
Quanto mais fazer a mala
Pra viver de amargura
          XXXIII
Seu pai lhe fez uma jura
Lhe fazer prisioneira
Castigo pra vida inteira
Da vergonha que passou
A Maria nem ligou
Aceitou resignada
Mil vezes ser castigada
A viver desiludida
Desencantada da vida
Contando carnaubeira
           XXXIV
Um amor pra vida inteira
Era o sonho de José
Sua reza, sua fé
Nunca foram abalada
Sua mãe, desintrigada
Visitou Dona Zefina
Especulou da menina
De quanto tempo não via
Voltou que não se cabia
Trazendo boa notícia
           XXXV
A Maria com malícia
Usando o sexto sentido
Mandou bilhete escondido
Endereçado pra Zé:
No dia de São José
Me faça uma serenata
E me leve pra Regata
Lá na Praia do Preá
Deixe a onda me levar
Pra depois me socorrer
          XXXVI
Zé Maria ao receber
Açucarado bilhete
Contratou o clarinête
Do Tião da Boemia
Da meia noite pro dia
Roubaria sua amada
A intriga tava armada
Isso não acaba bem
Era o povo do Vintém
Contra o povo da Corôa
         XXXVII
Numa noite de garoa
A serenata comeu
Sua mãe reconheceu
No buraco da janela
O ladrão da filha dela
No pé de jabuticaba
A janela destrancada
A filha num pé e noutro
Depois do cabresto solto
É água de morro abaixo
          XXXVIII
O velho falando baixo
Chamou a sua mulher
Mandou fazer um café
Servir umas cajuína
Mandou chamar a menina
Abriu a porta da sala
Mandou fazer sua mala
E abraçou a Maria
Este é o último dia
Do castigo que lhe dei
          XXXIX
Ali, na forma da lei
Lhe entregou a Maria
O José não se cabia
De tanta felicidade
Agradeceu a bondade
Do Sr. Bento Machado
No seu cavalo celado
Subiu Maria nos braço
Depois partiu pro abraço
Pra festa de São José
             XL
A enchente da maré
Com toda força do mundo
Levou Maria pro fundo
Sem dá tempo de gritar
José não sabe nadar
Pra mode lhe socorrer
Zé já tava pra morrer
Quando “vêi” uma jangada
Com Maria engasgada
Da água que engoliu
            XLI
Maria com muito frio
Tremia desconsolada
Queria ser resgatada
Como conta no cordel
Nos braços do menestrel
O seu amor, o seu Rei
Não assim, no aperrei
De carona na jangada
A barriga cheia dágua
Em plena lua de mel
            XLII
Quase fui parar no céu
Disse Maria a José
Veja as coisa como é
No primeiro passear
Vi a onda me levar
Como leva uma semente
Se não fosse aquela gente
Voltando da pescaria
A onda me devolvia
Toda comida de peixe
           XLIII
Nunca mais você me deixe
Passar de “água no pé”
Milagre de São José
Lhe salvou da viuvez
Todo ano, neste mês
Vou pagar uma promessa
De trazer uma remessa
De fulô de manacá
Jogar nas onda do mar
Em forma de oferenda            
            XLIV
A Maria é minha prenda
Eu sô José, dos Pinheiro
Passei o cordel inteiro
Fingindo que não sabia
A sua caligrafia
Na pedra do ribeirão
Desenho de coração
O nome dela e o meu
Depois ainda escreveu
Meu coração machucado
             XLV
Sou Maria, dos Machado
Não sô de derretimento
Ali naquele momento
Estava fragilizada
A janela entramelada
Pois estava de castigo
Tu, combinava comigo
Tu me fazia as vontade
Era a minha liberdade
O adeus à palmatória
            XLVI
Aqui termina a história
De Maria e de José
Ela de pedra na mão
Ele de bicho no pé
O casamento se deu
Na festa de São José
José amola a enxada
Maria faz o café
Só sei que ainda resmunga
Na hora dos cafuné!!!