ZÉCATINGA e
VAGAREZA
I
(VAGAREZA)
O meu nome é Vagareza
Tenho um amigo do peito
Zécatinga foi eleito
A catinga do planeta
Estralo de caçulêta
Ligeiro que nem a bala
Pulou de dentro da mala
No dia que foi nascido
Não sei, mas deve ter sido
Aborto da natureza
II
As coisas do Zécatinga
São tudo fora de rumo
Não larga a masca de fumo
Por causa das muriçoca
Diz que gosta da Maroca
Que mora do outro lado
Mas tem aquele cunhado
Com a sua esquisitice
Pelo jeito que ele disse
Só pode ser baitinga
III
É o veneno da cobra
Quando dá uma cuspida
Acabou com uma vida
Um dia de madrugada
Sapecou a machadada
No vulto dentro do muro
Como tava muito escuro
Só foi ver no outro dia
Velório de romaria
Coitada da sua sogra
IV
Apesar de ser zanôi
Ele é bom de pontaria
Sem querer um certo dia
Entrou numa confusão
Ele, na sua razão
Não respeitou a patente
O povo ali presente
Ficou de queixo caído
O guarda foi atingido
No mei da bila do oi
V
Namorou por muitos anos
Serafina seu amor
Foi quando me convidou
Pra conhecer o pai dela
Só tinha beijado ela
Assim na correspondência
Na hora da recompensa
Uma moça com dordói
Mal podia abrir o zói
Foi doído seu engano
VI
Saiu de pano passado
Mudelito de jacu
Parecia um cururu
Pro rumo da cantoria
Já ia raiando o dia
Encontrou a Setembrina
O cheiro de criolina
Espalhou na capoeira
Já era segunda feira
Os dois ainda grudado
VII
Perdeu todo seu dinheiro
Com uma compra de gado
Ficou um mês internado
Por causa de anemia
Depois de quarenta dias
Infezado sem comer
Eu sem nada merecer
Inda sofro na intriga
Agora você me diga
É ou não é um fulêro
VIII
Ele nunca se atrasa
Para ver o futebol
Cheirando carne de sol
Minha mulher fica puta
Ele faz que não escuta
Tira caca do nariz
É um momento feliz
Quando ele vai embora
Inda fica meia hora
A catinga pela casa
IX
Ele mora num casebre
Que só tem um aguidá
Nem cacimba tem por lá
Pra lavar sua catinga
Se morasse na zaninga
Tinha o rio pra nadar
Não precisava ficar
Dez dias na mesma roupa
A água tem que ser pouca
Se não lhe mata de febre
X
Fui comer na sua casa
Foi só eu de convidado
O chão de barro pisado
Uma esteira de capim
Ele colocou pra mim
Um aguidá de traira
Uma alça de imbira
Na cumbuca de pirão
Faça cirimônia não
Traira assada na brasa
XI
Me contou apaixonado
Que se riu pra Filomena
A menina mais pequena
Da Maria do Juá
Desse dia para cá
Filomena de mansinho
De longe corta caminho
Tem medo de assombração
Até pediu proteção
Pro filho do Delegado
XII
Um amigo bom assim
Não se acha todo dia
De novinho não fidia
A mãe podia banhar
Difícil de aguentar
Comendo na mesma mesa
Me chama de vagareza
Porque ando devagar
Zecatinga vai contar
O quanto gosta de mim!!!
XIII
(ZÉCATINGA)
Aconteceu bem assim
Parecia um demente
Eu fugindo da enchente
Com um bode na cacunda
Vagareza de segunda
Nadava feito uma mesa
A água da correnteza
Não cobria um coelho
Ele com os cutuvelo
Atolado no capim
XIV
Joguei o bode no rio
Pra salvar o companheiro
A água só no joelho
Nem a roupa ta molhando
Ele ali se afogando
Com priguiça de nadar
Se danou a praguejar
Quando lhe botei na beira
Pressa demais é besteira
Quanto mais quem não pediu
XV
Pra recuperar o bode
Nadei feito condenado
Vagareza pro seu lado
Não demonstrava uma ruga
Qualquer dia a tartaruga
Passa por cima de ti
Carreira de jabuti
Ta no teu DNA
Tudo nele é devagar
Até hoje sem bigode
XVI
Aborto da natureza
Eu sei muito bem quem é
A enchente da maré
Devolveu como refugo
Sobre um monte de sabugo
Boiando sem rumo certo
Pescador passando perto
Recolheu a encomenda
Com jeito de oferenda
La estava vagareza
XVII
Precisou tomar um susto
Para conseguir falar
Pôs na feira pra doar
Fez um bingo na quermesse
Não achou que lhe quisesse
Levou de volta pra casa
Hoje ele criou asa
Fica falando de mim
Gosto dele mesmo assim
Embora não ache justo
XVIII
Passei os quarenta dias
Trancado com cadiado
Só porque comprei um gado
Que ele também queria
Veja só a putaria
Que vagareza me fez
Me trancou mais de um mês
Comprou o gado primeiro
Pagou com o meu dinheiro
Prometeu que devolvia
XIX
Zanôia é Mariquinha
A mulher que lhe pariu
Por isso caiu no rio
De onde lavava roupa
Esqueceu a coisa pouca
Fazendo não sei o quê
Quando lembrou de você
Olhando pra dois lugar
Na correnteza a boiar
A titica de galinha
XX
Namorei uma menina
Escrevia todo mês
Foi quando chegou a vez
De falar com o pai dela
Vagareza na cancela
Ficou cagando de medo
Vou lhe contar um segredo
Que hoje muito me dói
Vagareza pôs os zói
No irmão de Serafina
XXI
Buato de mentiroso
A machadada que dei
Se eu nunca me casei
Como matei minha sogra
Vagareza é uma cobra
Com andar de tartaruga
Uma espécie de verruga
Que a gente tem saudade
Comparo sua amizade
Com uma talba de fojo
XXII
Vagareza certo dia
Como posso lhe contar
Inventou de namorar
Uma moça da cidade
Foi uma calamidade
Para quem não merecia
O coitado não sabia
Dos predicado da moça
Tinha um olho de louça
E era torta da bacia
XXIII
Vagareza se atrasa
Em tudo que vai fazer
Quando senta pra comer
Os prato já tão lavado
Se firmar um combinado
Só chega no outro dia
Sua comida esfria
Enquanto pega farinha
Só pega uma galinha
Se for quebrada da asa
XXIV
Vagareza foi levar
O dicumê no roçado
Sua mãe butou recado
Pra chegar no meio dia
Chegou já escurecia
E seu pai com malvadeza
Amarrou o vagareza
No tronco da catingueira
Amanhã que deus queira
Eu volto pra te buscar
XXV
Nunca vi home tão mole
Para o lado de muié
A minina da Raque
Se butô pra ele só
Vagareza de pongó
Fez que nem butô repara
Merece surra de vara
Pra dexá de sê lesado
Mesmo sendo bulinado
Vagareza não se bole
XXVI
Vagareza só pissui
Uma calça de riscado
Quando volta do roçado
Lhe pindura no cordão
Os inseto cai no chão
E sobe pelas parede
Impesteia sua rede
Acha bom é se coçar
Sua vida é balançar
Sobre um saco de gurgúi
XXVII
Agora formô casal
Não entendi sua pressa
Parece que foi promessa
No passado de fogueira
A moça toda faceira
Por causa dessa titica
Sem querer fazer futrica
Mais já iscuto buato
Que um rasto de sapato
Foi visto no seu quintal
XXVIII
Não entendo esse povo
Da língua desse tamanho
Parece que tomar banho
É coisa melhor que tem
A sujeira me faz bem
Pra espantar muriçoca
Depois a minha Maroca
Não reclama do meu cheiro
Se vier o chuvueiro
Eu tomo banho de novo!!
XXIX (VAGAREZA)
Zécatinga tua asa
Já está grande demais
Não sei o quê que te faz
Achar que tão te ouvindo
Mais de hora só mentindo
Querendo me derrubar
Se eu resolver contar
O quanto tu é seboso
Urubu mais corajoso
Não voa na tua casa
XXX
O suvaco lhe abriga
Criação de carrapato
Pensei que fosse buato
Mas pude presenciar
A camisa firviar
De aranha e percevejo
Qual mulher que dá um beijo
Num cabra fidido assim
Tu precisa dar um fim
Parar de botar lombriga
XXXI
Tem catinga porque quer
Parece gostar do nome
Se antes de virar home
Tua mãe te dava banho
Agora desse tamanho
Morre de medo de água
O travesseiro, com mágoa
Ta nos planos de fugir
Não agüenta sentir
A catinga do seu Zé
XXXII
Vou falar com a Noviça
Pra pedir pro Seu Vigário
Uma reza de rosário
Um pouco de água benta
Penitência de quarenta
Pai Nosso Ave Maria
Tomar banho todo dia
Como se fosse promessa
Na segunda tu começa
Teu nome saiu na Missa!!!